Como Surgiu A Astrologia Védica?
A astrologia védica surge inicialmente do contato do povo indo-ariano (ancestrais dos indianos de hoje) com a Babilônia no Primeiro Império Persa§ no final do período védico da Índia (de 1.500 a.C. a 600 a.C.); neste primeiro momento, ela se desenvolve de forma isolada, até então seu principal uso era em astrologia eletiva (muhurtha) para melhorar os resultados em rituais e cerimônias, neste início, a ferramenta mais utilizada eram os nakshatras. Os grandes sábios daquele tempo na Índia passaram sua tradição oralmente por várias gerações. Por volta da Idade Média da Índia, o contato com os gregos e com a astrologia helenística, registrados em vários textos como o Yavana Jataka (Astrologia Segundo os Gregos), Paulisa Siddhanta e Romaka Siddhanta, fez com que ela passasse a se aprofundar mais nos mapas de nascimento de pessoas (jataka) e no significado dos signos, formando a jyotisha clássica medievalista, com técnicas já adaptadas ao pensamento, língua e valores hindus.
Durante toda a idade média da Índia, ela foi de uma escritura sagrada acessória para um dos ponto centrais e inseparáveis do cotidiano da fé hindu (Sanatana Dharma, o Caminho Eterno), fazendo parte do nascimento, escolha de noivo para o casamento, comemoração de festivais e cerimônias de todos os tipos, aberturas de comércios, decisões políticas, saúde, morte e pós-vida.
Na contemporaneidade, a astrologia védica continua no cotidiano indiano e é considerada uma disciplina de ensino superior na Índia, e mais recentemente, desde o processo de informatização na década de 1980 iniciado na cidade de Chenai pelo grande astrólogo B. V. Raman, a jyotisha tem se mesclado a computação, e nos nossos dias até mesmo à inteligência artificial, e é praticada em todos os lugares do globo, tendo influenciado até as formas de astrologia de outras partes do mundo.
O vaishnava (devoto de Vishnu) Parashara, sábio e pai de Vyasa, compilou o ofício dos astrólogos védicos na obra “Brihat Parashara Hora Shastra” (em português, A Bíblia da Astrologia Védica) à partir do conhecimento que recebeu de Narada. Outras obras tardias bastante importantes são: o Brihat Jataka (A Grande Obra de Varaha Mihira), reconhecido como um documento de igual ou maior importância pelos praticantes do Sul da Índia, e Phaladeepika (A Colheita da Luz) de Mantreswara.
Introdução A Jyotisha
A jyotisha não é somente uma forma de astrologia, mas também um vedanga, ou seja, uma disciplina auxiliar para compreensão dos Vedas, as sagradas escrituras consideradas máxima autoridade por bilhões de hindus do mundo todo. A Astrologia Védica ganhou esse nome de forma bem recente no Ocidente, por volta da década de 80 quando revistas de ayurveda e yoga ocidentais tentavam apresentá-la ao mundo ocidental. Na verdade, o seu nome original na Antiguidade, como encontramos nas escrituras, é Jyotisha (ज्योतीश). Adentraremos mais a respeito da rica etimologia desta palavra em um artigo dedicado.
A Jyotisha também é chamada “os olhos dos Vedas” (vedachakshu), porque é dessa maneira que podemos saber o presente, o passado e o futuro, ainda que alguém não possua necessariamente o dom de vidência. Por isso, Varahamihira argumenta que um bom astrólogo védico deve ter o tratamento semelhante a de um rishi (sábio do passado), porque ao ter acesso a este conhecimento passa a ter as lentes de percepção de um iluminado, podendo até mesmo esquadrinhar o coração dos homens.
Existem alguns debates se a astrologia védica é de fato “védica”, pois seu primeiro registro sistematizado escrito foi bastante posterior aos quatro Vedas e seu desenvolvimento na história da Índia ocorreu principalmente com textos que remontam ao período medieval indiano após o século VII. Por isso, alguns autores modernos preferem chamá-la de “astrologia hindu”, ou ainda, usar o termo védico como sinônimo de “povo indo-ariano” sem necessariamente usá-lo como uma menção às Escrituras Védicas. Porém, existem diversas menções ao conhecimento astrológico da jyotisha nos textos sagrados, de forma que alguns de seus pressupostos possuem base de autoridade em textos shruti (revelação divina), enquanto outros são realmente smriti (passíveis de atualização e recontextualização).
“O Senhor que é e não nasceu [Vishnu], teve muitas encarnações. Ele encarnou como os 9 planetas (navagrahas) para conceder aos seres vivos os resultados de seus karmas. Ele é nosso Auxiliador, e assumiu a forma grandiosa dos corpos celestes para destruir as forças malignas e sustentar os seres divinos [através dos avatares].” – As Encarnações Dos Planetas, trecho do Brihat Parashara Hora Shastra.
A astrologia não se limita exclusivamente aos temas humanos, ela interage com uma multidão de outros conhecimentos, pois é uma ciência que estuda a relação entre os eventos astronômicos e as diversas áreas da vida humana e terrestre, que podem ser dos mais variados tipos e campos de atuação. Os planetas são chamados de “garbhas” na astrologia védica, ou seja, eles são parte da composição de tudo que existe nesse mundo. O que a astrologia védica estuda é tudo o que a mãe de criação de Krishna, Yashoda, viu ao olhar dentro de sua boca.
Quando Krishna, o jovem Deus, era apenas uma criança, seus amigos reclamaram à sua mãe de criação, Yashoda, que o menino havia comido terra e que sua boca estava completamente cheia. Krishna, uma criança arteira como era, era conhecido por roubar os queijos das queijeiras para comer, mas comer terra era algo surpreendente até para ele§. Após sua mãe indagá-lo e desafiá-lo a abrir sua boca, ele disse: “Todos os meus amigos que se queixam de mim são mentirosos, olhe para dentro da Minha boca”. Ela retrucou: “Se você não comeu terra, então a abra bem”. Quando Krishna abriu Sua boca, ela pôde ver dentro todas as entidades móveis e imóveis: o espaço, as ilhas, os oceanos, a superfície da terra, o vento soprando, o fogo, a lua, as estrelas, todos os sistemas planetários, todos os elementos, os sentidos, a mente, a percepção sensorial, todas as gunas, o tempo destinado às entidades vivas. Vendo todos esses aspectos da manifestação de Deus, ela ficou temerosa da natureza divina de Seu Filho, mas soube que ele era uma encarnação do Senhor Vishnu§.
O Sábio Dirghatamas diz no Rig Veda hino I.164.36 que os planetas são a forma como Vishnu sustenta e mantém este mundo, estando todos sob Sua direção e por isso tudo está subordinado à ação deles, Parashara diz: “O desenvolvimento, o progresso e queda de um povo, a criação e a destruição do universo estão todos sob a administração e controle dos Navagrahas (planetas). Portanto, eles são os mais veneráveis.” (BPHS, capítulo 84).
Dentro desta Ciência Védica, nós temos diferentes matérias que a dividem de acordo com a ênfase em determinados assuntos. Sendo estes:
- Hora ou Jataka (astrologia natal) – astrologia focada no nascimento das pessoas;
- Ganita ou Siddhanta (cálculo astronômico) – cálculos astronômicos para prever posições que serão usados na confecção de mapas védicos;
- Samhita (astrologia mundana) – previsão de acontecimentos mundiais, como desastres naturais, eventos geopolíticos, análise dos sinais da natureza e estudo de correspondências de animais e plantas;
- Prashna (astrologia horária) – ferramenta oracular da astrologia para analisar uma pergunta de um consulente sem seus dados de nascimento, servindo também para verificar o karma atual;
- Muhurta (astrologia eletiva) – cálculo para descobrir momentos propícias para negócios, casamento e práticas espirituais;
Como esta é uma ciência védica, é fundamental que ela seja estudada com um mestre experiente, evitando assim a especulação de conhecimento, a disseminação de informações falsas, o medo, o pavor, conclusões precipitadas, sintomas de loucura, delírio de grandiosidade e a falta de coesão nos conhecimentos adquiridos.